Nem um Nobel dá jeito no Brasil

Douglass North veio ao Brasil em 1961 por três semanas em uma missão¹. A visita de North era parte dos preparativos da viagem de Celso Furtado a Washington para buscar recursos do governo americano para o apoio quinquenal da Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste). A missão de North era entender previamente a proposta de Furtado e orientar o governo americano.
North ficou vinte dias no Brasil apresentando seminários, visitou universidades e escreveu alguns textos. Também se encontrou com Eugênio Gudin e Roberto Campos.

Douglass North (1920-2015) foi um economista laureado com o prêmio Nobel de economia em 1993. O prêmio foi dado graças à aplicação da teoria econômica e métodos quantitativos para explicar mudanças econômicas e a economia novo-institucional.
North publicou textos e livros argumentando que as instituições – especialmente o direito de propriedade privada – são importantes para o crescimento econômico. Esse estilo de pesquisa ficou conhecido como “nova economia institucional”, e os pesquisadores que defendiam essa tese, de “novos institucionalistas”. Para o economista, as instituições deveriam prover um sistema judicial capaz de que os contratos fossem cumpridos, provir o Estado de direito e garantir os direitos de propriedade. Quando essas instituições são disfuncionais, é muito difícil construir as coalizões necessárias para fazer reformas.

Já Celso Furtado (1920-2004) foi um economista, diretor da Comissão econômica para a América Latina (CEPAL), ministro do Planejamento no governo de João Goulart, ministro da Cultura no governo Sarney, primeiro superintendente da SUDENE e um dos principais teóricos do desenvolvimentismo no Brasil.
Furtado acreditava na intervenção do Estado para promover o desenvolvimento econômico no Brasil. O objetivo da SUDENE e Furtado era industrializar o nordeste de forma artificial.

Tanto Celso Furtado quanto Douglass North lutaram na Segunda Guerra Mundial, Furtado pela Força Expedicionária Brasileira e North serviu a Marinha mercante.

No Brasil, North fez algumas críticas quando visitou o Nordeste e viu um grande nível de homens desempregados numa grande fila esperando para pegar seguro-desemprego. Fez críticas ao nível de inglês e que candidatos a pós-graduação no exterior pelo ICA estudavam coisas sofisticadas em exagero ao invés de focar no essencial. Apesar de muitas críticas, North elogiou a cidade de São Paulo, comparando com a cidade de Chicago (só que com menos favelas), disse também que a paisagem do Rio de Janeiro provavelmente não tem em nenhum outro lugar do mundo.

O Plano diretor da SUDENE foi criticado por North, que via a industrialização do Nordeste como inviável. Na visão de Furtado, a indústria seria o único caminho para a região alcançar o desenvolvimento. North via que a mão de obra tinha baixa qualificação, o baixo mercado de consumo e a falta de recursos naturais básicos impediam a atividade industrial.

A SUDENE tinha como objetivo aumentar a oferta de alimentos no Nordeste e fazer um programa de colonização subsidiada para transferir um milhão de pessoas da região semiárida. Também tem uma seção para educação no Plano Five Year Plan, educação técnico-científico, com ênfase no ensino superior. O orçamento para essa seção era de Cr$ 10 milhões (0,36% do orçamento da SUDENE em 1961)³. Contra isso, North argumenta que o primeiro a se pensar era no aumento da qualidade do ensino básico.

De volta aos EUA, o conselho de North ao governo é que existiam duas opções: Não se envolver, ou se envolver profundamente. Ele não acreditava que a proposta seria seguida, visto que após os conselhos dados a SUDENE, poucas coisas foram modificadas no plano.

Em 1962, o chamado Northeast Agreement ficou pronto e foi assinado em abril. De modo geral, o Northeast Agreement estava mais próximo das ideias de Furtado do que da de North. Após o assassinato de Kennedy e o golpe militar, o acordo foi abortado.

Após mais de 60 anos, a região nordeste continua sem desenvolvimento, controlada pelo coronelismo, refém das políticas populistas, baixos níveis de alfabetização, saneamento básico, segurança, presa a ideias que sempre guiaram a região: instituições extrativistas, elite política cheias de privilégios e o Estado guiando o “desenvolvimento” regional.

Rejeitaram a ajuda e ideias de um personagem que acabaria sendo laureado com prêmio Nobel de economia para adotar as ideias que acorrentam não só a região Nordeste, mas como o país inteiro na pobreza.


Referências

1 O projeto americano “project # 512-79-055 (U.S. Operations Missions to Brazil 1961)” foi uma iniciativa do então presidente John F. Kennedy (1917-1963) que oferecia assistência aos países da américa para o desenvolvimento econômico. O projeto era parte da “aliança pelo progresso”, um programa de cooperação econômica entre o EUA e a América Latina proposto por J.F. Kennedy em março de 1961.

2 As referências sobre a viagem de Douglass North ao Brasil e todas as suas opiniões, falas ou ações foram tiradas dos arquivos da David M. Rubenstein Library que pode ser acessado no link https: //www.cambridge.org/core/journals/journal-of-the-history-of-economic-thought/article/abs/2017-hes-presidential-address-economists-and-their-travels-or-the-time-when-jfk-sent-douglass-north-on-a-mission-to-brazil/8F1B4DAC0670FB5F75C5DB02D15265C0#access-block

3 Sudene. (1961a). Five-year plan for the development of the Brazilian Northeast. Recife: Sudene

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